terça-feira, 28 de dezembro de 2010

O QUE DISSERAM AS MÃES...





Humor

O QUE DISSERAM AS MÃES...

Silas Correa Leite

“Quem tem mãe não tem medo”

Henfil


O Que Disseram As Mães de:

01)-Garrincha: “Esse pé torto nunca bateu bem da bola”

02)-Freud: “Não sei porque só pega no soninho quando estou na cama com ele”

03)-Darwin: “Esse meu filho parece que tem macaquinhos no sótão”

04)-Jonas: “Ele ainda vai se meter numa enrascada com alguma baleia”

05)-Noé “Vive enchendo a casa de bicho estranho”

06)-Nero: “Esse regazzo é fogo!”

07)-Hitler: “O discurso dele é só fumaça”

08)-Marco Pólo: “Esse meu filho curioso vai longe”

09)-Caetano Veloso: “Esse moleque tá se achando”

10)-Arnaldo Jabor: “É um bufão que acha que é o que não é, mas só faz fita”

11)-Charles Chaplin: “Não liguem, com o Carlitos é assim mesmo, devagar quase parando, e tudo em preto e branco”

12)- Woddy Allen: “Sei não, se não fosse meu filho, eu diria que não é meu filho”

13)-Lula: “Ele é o grande milagre da família Silva do Brasil, o verdadeiro Silva-se”

14)-Maluf: (Censurado)

15)-José Serra: “O cagão sempre foi da pá virada, e nunca soube perder...”

16)-Bush: “Ele é desmiolado mesmo, sempre gostou de brincar que é Deus”

17)-Ray Charles: “Não se enxerga não, boy?”

18)-Jorge Luis Borges: “É virgem. Sem tirar nem pôr”

19)-Frank Sinatra: “Ele gosta de tudo o que vem acompanhado de uma azeitona. Mulher, Martini, Máfia...”

20)-Poeta Drumond: “Se te atirarem uma pedra, meu filho, faça um poema”

21)-Bethoven: “É uma fuga atrás da outra. Ainda vai acabar ficando surdo”

22)-Paulo Francis: “Acho que joguei fora a criança e criei a placenta”

23)-Karl Marx: “Precisa fazer Capital. Ou trabalho”

24)-Einstein: “Vive no mundo da lua”

25)-Cazuza: “Não é flor que se cheire”

26)-Clodovil: “Adotei um casal de filhos num só”

27)-Ziraldo: “Menino maluquinho ele...”

28)-Silvio santos: “Tudo por dinheiro. Vai encher o baú”

29)-Hebe: “Ela ainda vai dar certo”

30)-FHC: “Sempre achou que tem o rei na barriga. Mas não é nada real”

31)-Pluto: “E ainda acham que ele não é filho do Walt Disney, mas filho da Pluta”

32)-Pedro Álvares Cabral: “Esse só embarca em canoa furada, ô raios. Ainda vai dar com os zurros nágua”

33)-Do autor: “Silascô”

-0-

Silas Correa Leite – República Etílico-Rural Boêmica de Itararé
E-mail: poesilas@terra.com.br
www.portas-lapsos.zip.net






domingo, 26 de dezembro de 2010

Entrevista com Silas Correa Leite, de Itararé, Cidade Poema





SUPERENTREVISTA Com o Poeta, Ficcionista, Romancista, Resenhista e Ensaísta, Silas Correa Leite, Escritor Premiado em Verso e Prosa – E-mail: poesilas@terra.com.br
Santa Itararé das Artes, SP, Brasil




SuperEntrevista: Como você começou a escrever? Quem lia para você ao principio?
Comecei a escrever mais ou menos entre seis e sete anos. Meu pai lia histórias, jornais, a Bíblia, era um maravilhoso contador de causos, desses de começar a falar e juntar gentarada, amigos, vizinhanças, passarinhos... e entre uma e outra toada brejeira no acordeom vermelho, lá vinham histórias...

SuperEntrevista: Qual é seu gênero favorito? Algum link onde possamos ver ou ler algo sobre sua obra recente?
Meu gênio número um é o Leon Tolstoi. Sobre meus trabalhos, vc procurando num buscador como o Google, vai me encontrar em quase 500 sites. Coisas atuais no
www.portas-lapsos.zip.net – pelo segundo ano escolhido um dos melhores blogues do UOL.


SuperEntrevista:Como é seu processo criativo? O que ocorre antes de se sentar a escrever?
Meu processo criativo é não ter processo criativo nenhum. Folha em branco? Assino embaixo, corro o risco. VC tb pode ligar três computadores, dar um tema para romance, um para microcontos ou contos infantis, um para poemas... ou qualquer coisa assim, que em horas vc vai ter centenas de páginas dos trabalhos que vc sugeriu o tema... Entre o escrever e o depois de escrever, o vazio, o nada...

SuperEntrevista:Que tipo de leitura ativa sua vontade de escrever?
Leio de gibis a Platão, de romances a jornais, humor, mas poesia é o meu fraco. Então, a vida – ou o horror da vida – me estimula (por assim dizer) a escrever. Eu escrevo como quem se livra da existencialização, delatando-a, contando-a, feito antena de minha época de horror... tempos tenebrosos...

SuperEntrevista: Quais são para você os ingredientes básicos de uma historia?
Não vejo assim, não curto isso; toda loucura é santa. Meus textos não se preocupam por isso... todo tema é luz, toda narrativa é palco, todos os ingredientes são humanos (humanos?), toda vida é um pé no sacro... Eu escrevo para me livrar do que penso/sinto/capto/crio... com meu lado lispectoriano... sentidor...

SuperEntrevista:Em que sapatos você se encontra mais cômodo: primeira pessoa ou terceira pessoa?
Gosto da primeira pessoa, porque me verto; mas em qualquer prisma, ou enfoque, intertexto que seja, passado, presente, futuro, mudando de cara e pessoa, vazo-me...

SuperEntrevista: Que escritores conhecidos são os que você mais admira?
Gosto do Guimarães, do Machado, do Érico, da Clarice, do João Cabral, da Hilda Hist, e dos estrangeiros entre o Tolstoi o Umberto Eco, o Ítalo Calvino, e outros, do Brasil atual o Scliar...

SuperEntrevista: O que torna um personagem crível? Como você cria os seus?
Meus personagens não existem. A minha loucura é que os tornam críveis, mas nem esse propósito tenho. Gosto de viajar na maionese, na batatinha, assustar com o que crio, fazer o mundo pensar ao me ler, como um ser humano seria capaz de escrever isso... Não crio personagens... eles que me recriam neles, eles que se criam por si mesmos... posso até escrever um romance sem personagem, ou oculto, ou de uma outra espécie imaginada... Não crio, eles se apresentam e se assuntam... entrincheirados de palavras e parágrafos, quando eu ponho pingos em dáblios...

SuperEntrevista: Você é igualmente hábil contando historias oralmente?
Fraco. Piadas, causos, talvez. Sou vencedor do Primeiro Salão Nacional de Causos de Pescadores (USP) de um causo que escrevi bem e que se contasse não ficaria tão bom... Eu mal me existo oralmente. Gosto mais de escrever do que de existir. Gosto mais de ler do que de respirar. Já pensou?

SuperEntrevista: Profundamente em sua motivação, para quem você escreve?
Escrevo para dar testemunho do eu fiz a partir do que a vida me fez de mim. Escrever está no meu DNA. Escrevo a resistência, a sobrevida, o entre-lugar do Eu de mim...

SuperEntrevista: Escreve como terapia pessoal? Os conflitos internos são uma força criadora?
Catarse. Onirismo. Terapia. Jorro neural. Essas coisas. Conflitos eu filtro... De onde vim, para onde vou, o que sou – se é que sou – tipo existir a que será que se destina... Força nutricional da alma nau...

SuperEntrevista: O feedback dos leitores serve pra você?
Muito pouco. Não escrevo pra isso. Gosto de elogios, adoro críticas, mas agora não tenho mais cura. Retorno é lustro no ego e só. Ainda vou assustar o mundo por escrever sobre coisas que ninguém jamais imaginou que um ser humano possa escrever a palo seco de existir... Existir? Corto os pulsos com poemas...

SuperEntrevista: Você se apresenta para concursos? Você recebeu prêmios?
Ganhei dezenas prêmios de renome em verso e prosa, em universidades até, até de microcontos em Portugal, consto em mais de 100 antologias em verso e prosa até internacionais, mas agora não participo mais de concursos... Passei essa fase. Acho que evoluo quando ovulo.

SuperEntrevista: Você compartilha os rascunhos de suas escrituras com alguém de confiança para ter sua opinião?
Eu mal tenho tempo de ler o que escrevo – mais de mil cadernos de rascunhos (logo devem ir pro Guiness Book) - que escrevo, vazo, detono, mal-e-mal leio e releio para publicar, correção, etc. Trabalho 12 horas por dia, 58 anos. Leva tempo levar e trazer coisas para opiniões...

SuperEntrevista: Você acredita ter encontrado "sua voz" ou isso é algo eternamente buscado?
Minha voz é: berrar é humano. É? Escrevo para testamentar que sim. Minha voz é minha ojeriza ao pântano da condição sócio-humana... A hipocrisia viça. Meu lugar não é aqui. Meu escrever é meu rastilho... Minha voz é um não estar num não lugar...

SuperEntrevista: Que disciplina você se impõe para horários, metas, etc.?
Escrevo o tempo todo, saco, sinto, olho, vejo, capto, antenas ligadas, sem obsessão, como se ganhasse a intuição, a percepção, até de ver o poema no ar (já escrito?) e simplesmente palavreá-lo...

SuperEntrevista: De que você se rodeia em seu escritório para favorecer sua concentração?
Fantasmas, memórias, cervejas, o lado sentidor do devir, blues, amendoim, tristices, e silêncio de doer no sentir...

SuperEntrevista: Você escreve na tela, imprime com freqüência, corrige em papel...? Como é seu processo?
Escrevo em folhas dos cadernos, ou direto na tela, e vai por aí o banzo-blues... Sempre corrijo até me matar de raiva de não ter mais tempo para refazer, corrigir...

SuperEntrevista: Que sites você freqüenta online para compartilhar experiências ou informação?
Mando para um monte de lugar, o Cronópios de vez em quando aceita alguma coisa... eu posto pelai nuns dez, mas já cheguei a postar em mais de trinta...

SuperEntrevista: Como foi sua experiência com editoras?
Péssima. Não acredito em editoras. Um mal necessário? Minha obra e currículo são melhores do que as editoras...

SuperEntrevista: Em que projeto você está trabalhando agora?
Acabando um romance louco tipo infanto-juvenil – mesmo que seja infanto-juvenil de loucos... Escrever é solo mas dói.

SuperEntrevista: O que você me recomenda fazer com todos esses textos que venho escrevendo há anos mas nunca os mostrei a ninguém?
Se enxergue. Desconfie. Re-escreva. Nunca vai estar bom, mesmo depois de estar bom. Eu que penso antes de pensar, não confio em nada assim. Tudo que está perfeito e acabado está podre, disse Brecht.

SuperEntrevista: Como você se define?
Um E. T. em dimensão/travessia errada...

SuperEntrevista: Qual é sua mensagem?
A minha mensagem é que todos têm que saber que o final feliz é que todo morrem...

SuperEntrevista: Sua biografia em quatro linhas:

Escrevo
Escrevo
Escrevo

Escravo

SuperEntrevista: Você publica seu trabalho na rede? Onde podemos vê-lo?
Melhor buscar no Google pelo meu nome. Tem até comunidades no Orkut, Twitter, e vídeos no YouTube. Pimenta no orkut dos outros é YouTube?

SuperEntrevista: Como nasce uma idéia? O que é para você a inspiração?
Tenho mil idéias. Escrevo umas e outras. Algumas aguardam paradas no ar a minha capitulação de escrevivê-las. E assim me ins/Piro.

SuperEntrevista: Que papel tem a tecnologia em seu processo criativo?
Tudo: sempre escrevi muito. A tecnologia facilita o monte, desconte, correções, arquivos, etc. Salva-me de mim.

SuperEntrevista: O que é arte?
Libertação do Ser de si.

SuperEntrevista: Em que circunstancias você tem as melhores idéias?
Na dor, na traição, na solidão, na hora de nossa morte. Amém ou Amem?

SuperEntrevista: Como você corrobora se uma idéia é boa?
Todas as idéias são boas. O que vc vai fazer delas que pode ser bom ou não.

SuperEntrevista: Três idéias criativas que você gostaria que tivessem sido suas.
Ah... milhares... talvez milhões... Infinitas...

SuperEntrevista: Quando e como você começou a ver você mesmo como artista?
Desde muito antes de nascer, acho. Depois guri. Depois a infância confirmou: miséria, fome. O que iria fazer daquilo? Material de trabalho. Juventude: lutas, utopias... Como contar a dor de ter sobrevivido? Pois é. Agora passando dos 50, muito acervo lacrimal. Do caso nasce o jazz?

SuperEntrevista: Por que tantos artistas e criadores têm personalidades voláteis?
Eu não me levo a sério. Quem se leva a sério carrega uma tromba.

SuperEntrevista: Você se considera pós-moderno?
Qualquer coisa assim.

SuperEntrevista: Como uma obra artística deve ser avaliada?
Não tenho medida. Quanto mais louca mais gosto. Deus deve amar os loucos?,

SuperEntrevista: O artista deve se reinventar a cada dia?
A si mesmo... Nova aurora a cada dia, como diria a canção da juventude...

SuperEntrevista: Que artistas você admira e de que maneira têm influência em sua obra?
Caetano, Machado, Charles Chaplin, Glauber, Drummond, etc.

SuperEntrevista: Qual é sua opinião sobre os subsídios públicos para a arte?
Acredito nisso. Vale a pena ver de novo?

SuperEntrevista: A arte autêntica é a arte necessária?
A arte visceral é indispensável...

SuperEntrevista: Você sofre ao se desprender de uma peça que tenha vendido?
Quando eu me livro de mim, perco lastro. Treino vôos?

SuperEntrevista: Ao comprar a obra, estamos mais que nada comprando o artista?
Estamos comprando almas, luzes...

SuperEntrevista: Para a arte não há guia. Como você sabe qual é a próxima coisa a fazer?
Nunca sei. Por isso me mantenho vivo e na luta... O devir me atiça...

SuperEntrevista: O que você acha de que grande parte das obras de arte contemporânea que os museus exibem seja de artistas que já faleceram?
Idéias historiais e vidas-livros

SuperEntrevista: Que papeis jogam em sua trajetória as figuras de marchante, representante, galerista, e intermediários em geral?
Sou anti-dinheirista. Se fosse pensar assim estaria podre de rico, Mas talvez tb mais podre... Sou amador depois que crio.

SuperEntrevista: Que tipo de encomendas você costuma receber?
Prefácios, orelhas, formatações, resenhas, ajudas em teses, em tccs, etc. Trabalho é treino.

SuperEntrevista: Qual de seus trabalhos é o que você mais gosta?
Poesias.

SuperEntrevista: Você coleciona algum objeto?
Sim: não há sensação no esquecimento...

SuperEntrevista: Endereços web, uma por linha
www.itarare.com.br/silas.htm
www.campodetrigocomcorvos.zip.net
etc.

SuperEntrevista: O que você aconselharia aos escritores iniciantes?
Sofram e apareçam. Mereçam-se. E nunca saiam de si. E se saírem, jamais caiam em si.




http://oliteratico.webnode.com/news/literatico/

domingo, 12 de dezembro de 2010

Conto de Natal "O Tocador de Acordeom" Silas Correa Leite Para o Pai, Maestro Antenor Correa Leite








Conto de Natal 2010


O Tocador de Acordeom



Depois de tantas irmãs, eu finalmente nasci. O primeiro varão do clã. Isso me deu alguns privilégios, inclusive e principalmente afetivos, claro, pois à época meu pai era rico, tinha comércio e lidava com lotes de terra no Bairro das Cem Casas, em Harmonia, Monte Alegre, Paraná, hoje Telêmaco Borba, região de Tibagi. Depois de mim ainda nasceram duas irmãs. Quando meus irmãos nasceram, eu já carregava a luz. E a cruz. Porque meu patriarca teve problemas com jagunços e grileiros do Lupion, corrupto governador do Paraná de então, e teve que voltar para Itararé, para não ser morto. Perdeu quase tudo que investira em terrenos. Aí é que começa a minha história. Por aí também começa o lado ruim de ser o chamado bendito fruto. Pois enquanto eu era guri, era bajulado, tinha do bom e do melhor. Quando começou a época das vacas magras, quem teve que cortar a infância pela metade e trabalhar, ajudando em casa, fui eu. De engraxate a vendedor de dolé de groselha preta, de bóia fria a vendedor de pipoca, de vendedor de banana-caturra a vendedor de caldo de cana, de bóia fria a aprendiz de marceneiro na Marcenaria Estrela do meu primeiro pai-patrão, o Jora Leite. O trabalho para ajudar em casa; o guri que eu era assumindo valores e ajudando o patriarca prover o lar. O pai também era regente de corais que fundava; era maestro de bandas e conjuntos regionais evangélicos que inventava de inventar; músico, compositor sacro, arranjador, letrista, dono de vários instrumentos, de bandolim a flauta transversal, de cavaquinho a banjo, de clarinete a acordeões. Mas o pior era eu, carregando o peso, já que meu o pai usava bengalas e tinha problemas de úlcera varicosa nas perdas, às vezes as feridas sangravam, ele tinha que usar meias elásticas e mancava então, e o guri magricela e cara de boi lambido que eu era, com amarelão, calcanhar de frigideira e andar-de-segura-peido, é quem tinha que carregar o bendito do pesado acordeom Universal Líder vermelho de 300 baixos que era uma cruz e tanto pra mim, pequeno, tão esquálido e cara de pidão. E o pai inventava de tocar na rádio, em praças públicas, na igreja, em cultos de oração, nas escolas dominicais, em variados horários, e era eu, o bendito fruto, rebento varão, filho homem, quem tinha que carregar o bendito do pesado instrumento. E o pai, Antenor, além de pregar, cantar e tocar, no acordeom era quem fazia firulas e se sentia à vontade, brilhante e vaidoso, ótimo pregador dos evangelhos também. E ainda, além dos hinos evangélicos, protestantes, como “Mais Perto Quero Estar meu Deus de Ti”, ou mesmo “Da Linda Pátria Estou bem Longe”, ou “Foi na Cruz... Foi na Cruz” ainda, aqui e ali, nos beiços de tardinhas, em frente do portão de tramelas de casa, na Rua 24 de Outubro, Vila São Vicente, em Itararé, nos idos de antigamente, nos tempos em que se amarrava cachorro com lingüiça de capivara, o artista do meu pai juntava tropé de gente, curiosos, vizinhos, passantes e passarinhos sondando do quarador, para ele então também solar Abismo de Rosas, Chão de Estrelas, algumas marchas-ranchos, valsas, xotes e outras modas bonitas mais. O céu por testemunha.

Mas eu tinha certa raiva do pai, entre uma mágoa e tristice. E além da vergonha de, mal me agüentando em pé, ir atrás dele – que dava no pira depressinha – parando malemal a cada cem metros, se tanto, para descansar do peso enorme do acordeom o que certamente cedo ou tarde me daria alguma hérnia. Mas eu, feito um cordeirinho desmamado, seguia religiosamente o pai, levando o acordeom para ele fazer seu show. Fraco, com raiva, envergonhado de mal me agüentar com o peso, saía cansado atrás do pai, pelas ruas de cacau quebrado de Itararé (paralelepípedos) enquanto minhas bonitas irmãs serelepes iam à frente, levando hinários, letras de músicas, Bíblias, partituras, todas elas bonitas e eu, ali, paradoxalmente ao que tinha sido bem tratado quando piá de tudo, naquele começo de adolescência, topetudo, cara de lambisgóia espeloteado, carregava o peso do acordeom que me lanhava a mão, cansava, me deixava birrento, de tromba, brabo com o pai. Será o impossível? Quando ele tocava, no entanto, fazendo bonito, eu me sentia feliz; é quando eu via prazer naquilo de sofrer, de carregar o peso para ele brilhar. Achei que, de alguma maneira, minha vaidade pueril talvez, nunca perdoaria o pai por isso. Por ter sido rico e ficado pobre. Por eu ter dado tanto trabalho – estive seis vezes para morrer – e ele ter gasto vários terrenos na farmácia do Chiquinho Pucci em Telêmaco Borba para me custear remédios caros e eu então poder sobreviver, escapar, e agora ali, pagando meu pesado e alto preço, carregando aquele bruto instrumento pelas ruas de Itararé a fora, enquanto ele fazia bonito e eu que quando bendito fruto carregara a luz, ali, pra mim, então, por fim também por força de ser o primeiro filho homem, carregava a cruz. Só por Deus. Apanhei muito de cinta, de vara de marmelo. Traquinas, turrão, topete arrebitado. Sempre fui muito hiperativo, o que minha mãe Dona Eugênia em bom português caseiro dizia espeloteado. Atentei muito minhas irmãs; acidentalmente taquei até fogo em serraria ao brincar com cepilhos e caixa de fósforos, ou seja: pintei e bordei. Só vendo pra crer. Isso porque meu pai não descobriu nem um por cento do que eu atinado aprontava. A mãe, até, dizia que eu dei dez vezes mais trabalho do que todos os outros filhos juntos. Por isso, dar alegria, ser contador de causos, tinha que ser a minha cota de compensação. Valeu a pena? Ah, mas carregar aquele acordeom pra lá e pra cá, era minha sina. Eu não suportava aquilo. Por isso, acho, talvez, mas só talvez, nunca aprendi música – sou um músico frustrado – nunca aprendi tocar instrumento nenhum. Comecei a estudar, mas parei por causa da palheta do clarinete na roupa – eu era disperso, vivia no mundo da lua – ou por causa dos calos nos dedos ao tentar aprender a tocar violão e cavaquinho com o meu Tio Jare, irmão de minha mãe Eugênia. Eu tinha bloqueado meu cérebro de alguma forma instintiva, e, a bem dizer, era também, falando sério, um manteiga derretida. Vão vendo. Quando tinha apresentações do meu pai, o que era rotina, beiçudo, lá ia eu carregar seu acordeom. Que sina. Assim foi toda a minha juventude, até deixar Itararé, terra-mãe, ir peregrinar minhas viajações por São Paulo, lutar, estudar, vencer na vida, ajudar meus familiares, escrever meus livros, depois de tomar licor de ausência de minha adorável Santa Itararé das Artes. Muito tempo depois que o pai morreu, pelos primos Paulo Rolim e Eugênio Cleto, fiquei sabendo de um ouvi-dizer do clã, o que me deixou muito triste por eu ter odiado carregar o acordeom do pai, e me fez finalmente ter de alguma forma perdoado o velho e entendido a missão do patriarca com o instrumento. Eram histórias que o povo contava, lados de Sengés, ventiladas pelo clã Correa Leite, e que me abriram o coração e desataram os nós de lágrimas guardadas. O Pai que nasceu entre 1900 e 1906 (nunca sabemos se a data de registro era certa), em 1930, quando o bando de Getúlio Vargas invadiu Itararé, ele que encorpara com outros jovens e era acendedor de lampiões de gás em Itararé, numa maroteira tentativa varonil de imprudente resistência à invasão de Itararé, até que fora preso feito um rebelde bom de briga e entrão na história. Saindo de um baile num circo que atuava em Santa Cruz dos Lopes, depois de dar seu show particular no acordeom de um palhaço cego seu amigo, com amigos joviais e bagunceiros de Itararé e de Sengés agitaram de tentar desencarrilhar vagões do trem na leva de revolucionários que viriam para a tal batalha de Itararé, quando Itararé foi bombardeada. Junto com a caravana do bombachudo gaúcho de São Borja vinham também estrangeiros, índios, negros, mamelucos, paroaras do Paraguai e Uruguai, biscates polacas; uma grande leva de putas mesmo, entre muares, burros de cargas, canhões velhos, e muitos soldados catados pelo caminho ou que se adensaram ao grupo, que se agregaram para terem o que comer, ver no que daria aquela briga nacional de meia-tigela contra a política café-com-leite de Washingtom Luiz, entre a turma paulista e os mineiros. Corria a guerra interna do Brasil que, como outras que deram com os burros nágua, essa se deu na mudança da oligarquia política, fechamento de um ciclo histórico, e Itararé foi palco, a história do Brasil passando por lá. Numa dessas tentativas isoladas de levante e revanche, o pai foi preso com seus cupinchas de ocasião, e uns mambembes soldados revolucionários o levaram, junto com amigos briguentos, para uma prisão num vagão de trem que estava parado na estação de Coronel Isaltino, adjunto ao rio Pelame. A ordem era deixar os bocós dos guerrilheiros ali, até morrerem de fome que fosse, mal vigiados por uns gaúchos cara de bosta seca, alguns estrangeiros, inclusive alemães e uma leva de pedaçudas polacas doentes para morrer de sífilis. O pai preso e sabia que, condenado de antemão, iria finar ali, pelo que intentara de inventar, correndo riscos, metido a valentão que sempre foi. Ficou preocupado, ponderou. Tinha a família, os amigos, os irmãos da igreja que largara, pois era um desviado da Presbiteriana então. Até que, entre os bens que os soldados pilharam das casas na região de Itararé toda, apareceu uma bela gaita de sete baixos importada. E foi nela que o pai, curioso, bom de prosa, dá licença, sim sor, pediu para tocar algumas polcas e xotes para agitar aqueles soldados, entreter as moças cor-de-rosa a beberem vinho, entre a turba a carnear animais que também pilharam em fazendas no entorno da região barulhada de Itararé. O pai ali, tocando acordeom para os guardiões do seu cativeiro, feito um refém tinha hora de banzo e, aqui e ali, ora puxava o fole e chorava, pedindo em promessas a Deus, para escapar daquilo, se ver livre, voltar pra igreja, salvar os amigos que, sempre da pá virada, metia em enrascadas das grossas como aquela que poderia ser fatal. Depois de tocar a noite toda, quase com os dedos sangrando, pois os revolucionários bêbados botavam alegria na tristeza deles naqueles ermos, quando um tipo alemão pediu também para solar uma musica de sua terra de origem, que lá ouvira de ancestrais. E tocou uma musica de crente, seus pais eram luteranos. Meu pai chorou. Emocionado. Um sinal de Deus? Só podia. Pediu pro alemão lhe ensinar algumas posições, fez tipo, logo, estavam amigos de ocasião, e o pai tocava aquela musica que muitas décadas depois, o filme Titanic consagrara, como “Mais Perto Quero Estar Meu Deus de Ti”; o navio afundando e os músicos tocando. Uma cena clássica do cinema americano. Pois o pai aprendeu e fez a promessa de voltar pra igreja, se escapasse da morte, criar juízo. Tenho a quem puxar?. Uma noite, Itararé já vencida, Getúlio Vargas indo amarrar o cavalo pampa no obelisco do Rio de Janeiro, assumindo a Presidência do Brasil, todos ratiando de bêbados, cozidos, depois do pai ter as mãos sangrando por tocar horas em parar, o alemão amiúde veio e tirou as amarras do pai, para que o pai também soltasse os amigos e pudesse fugir, só prometendo, para o imigrante clandestino em terras brasileiras, fugidio de diásporas da primeira guerra mundial da Europa, que usaria os instrumentos sempre para louvar a Deus, em memória do clã de origem nórdica.

O pai prometeu chorando e rapidinho escapou, pode assim viver mais de 70 anos constituir família, fundar corais e bandas em Itararé e na região de São Paulo e Paraná; ter pioneiros programas evangélicos de rádio em Itapeva, Jaguariaiva e Telêmaco Borba, podendo assim voltar para Jesus, salvar os amigos. E pagar a promessa, claro. Pois eu tinha sido ocacionalmente um ajudante dele naquela pregação, naquela louvação a Deus, carregando pra lá e pra o bendito do acordeom.

Muito tempos depois, já adulto descobri, que eu era uma espécie de armeiro do pai, naquela missão, como pagador de promessas. Um ajudante dele, e, então, finalmente descobri por fim, muitas décadas depois, que mesmo nunca conseguindo, por algum trauma instintal, preguiça frente a regras formais, neuras mesmo ou inércia cerebral (falha no psico-motoro) aprender a tocar nenhum instrumento, sendo para sempre um músico frustrado, também, talvez em memória do Pai e do seu Acordeom de Estrelas de Saudades, por causa disso que narro agora eu tinha sido marcado para sempre.

Sim, meus irmãos, eu tinha no meu próprio nome, desde o nascimento e registro no Cartório de Ventania, como uma sina, uma luz, algumas notas musicais... Si... lás... Escrevendo eu continuo solando meu pai pelaí, com o acordeom de minha alma fazendo versos como quem chora de amor e de saudade.
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Silas Correa Leite – Santa Itararé das Artes, Estância Boêmia
Obra da Série “Contos de Natal, E Acontecências em Verso e Prosa”
E-mail: poesilas@terra.com.br - Site: www.portas-lapsos.zip.net

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Leite Derramado - Conto de Silas Correa Leite




Microconto:

Leite Derramado



-Mãe, eu sou gay!

-Tá bom filho, tá bom, Júnior.

-Ué, você não vai chiar, ter um siricotico, causar um terremoto?

-Nem te ligo, guri, nem te ligo. Teu pai também era.

-Ué, e como foi então que eu nasci? Eu caí do céu de Itararé que nem purpurina?

-Ué, filhota, eu já não te falei que aqui em casa era o padeiro quem entregava o leite?

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Silas Correa Leite
Estância boêmia de Itararé

E-mail: poesilas@terra.com.br
www.portas-lapsos.zip.net

Microconto da Série “Eram os Itarareenses Extraterrestres?”